A história de um estrangeiro impostor
Olá tudo bem? Você é do tipo de pessoa que ao escutar elogios tem dificuldade de aceitá-los? Você é descrito frequentemente como um perfeccionista? Então pára tudo agora e leia esta história, pois você vai se identificar ou, talvez, conheça alguém muito próximo de você que se enquadre no perfil deste personagem. Então, senta que lá vem história 🙂
ERA UMA VEZ
Um menino chamado João, que nasceu no Brasil, sua família era muito humilde, se mudaram do Nordeste para São Paulo ainda quando João era muito pequeno.
João, o mais velho de 3 irmãos, sempre trabalhou para ajudar seus pais e com muito esforço conseguiu terminar sua faculdade de Sistemas da Informação, seguiu uma carreira de sucesso até alcançar um cargo de Gestão em uma Multinacional.
João era um funcionário muito admirado por sua equipe e colegas de trabalho. Reconhecido por seu talento e por ser um líder exemplar, tinha um desempenho excelente no trabalho em tudo que estava envolvido. Mas ninguém imaginava o que se passava na mente de João. Ele sentia um fracasso e achava que teve sorte, e que um dia todos descobriram que ele não era nada do que as pessoas imaginavam. Ele se sentia constantemente inseguro, ansioso e com medo de perder tudo que conquistou.
E, pior de tudo, achava que poderiam pensar que ele é uma farsa, um impostor. João acreditava que apenas escolheu esta profissão pois seria mais fácil conseguir um trabalho na área de T.I. Ao contrário do que diziam, não acha que tinha talento para trabalhar com tecnologia. João se comparava constantemente com seus colegas e sentia -se muito inferior, como se estivesse sendo um ator em seu próprio trabalho, se sentia um impostor.
Certo dia, João decidiu viajar, fazer um intercâmbio, ampliar seus horizontes, aperfeiçoar o inglês e alimentava uma forte esperança de que nesta nova fase de sua vida tudo seria diferente e esta sensação de insegurança e de sentir uma fraude mudaria. João acreditava que ele precisava se qualificar ainda mais ou talvez mudar de profissão.
João se matriculou em um curso de inglês no nível intermediário, em um mês passou para o nível avançado, mas achava que teve sorte, acreditava que por ser muito esforçado e estudar muito, a escola foi muito generosa e mudou ele de nível. “Nossa como o João tem sorte!” pelo menos é o que ele acredita.
Com visto de estudante e muita “sorte”, foi procurando arduamente por trabalho e conseguiu rapidamente uma oportunidade como assistente de loja na Penneys. Depois de alguns meses, foi promovido para supervisor. João continuou se considerando muito sortudo e agora ainda mais inseguro por ser estrangeiro, achava que poderiam descobrir que ele não tem talento para liderança, que ele não é bom no trabalho, que ele é uma farsa, um impostor.
Aquela sensação de insegurança que sempre acompanhou o João, permaneceu aqui na Irlanda. Por coincidência ou não, falando inglês intermediário, em uma terra estrangeira, com costumes e hábitos culturais completamente diferentes, João passava a mesma imagem para todos as pessoas que trabalhavam com ele, um funcionário eficiente, exemplar, inteligente, talentoso. Mas João só conseguia pensar que seu inglês não era fluente, que ele era um estrangeiro e que um dia seria demitido, afinal, além de sorte ele sabia como improvisar seu trabalho, não se considerava eficiente.
Ao concluir seu curso de inglês, João ingressou em um mestrado na área de Tecnologia, conseguiu rapidamente um estágio, hoje o João trabalha com visto de trabalho em um Multinacional na área de T.I, continua sendo considerado um profissional muito talentoso. Mas João continuou sofrendo e não acreditando em seu talento.
A CRENÇA DE SER UM IMPOSTOR
A história de João é fictícia, mas ilustra um típico exemplo de uma condição psicológica classificada como Síndrome do Impostor.
Pessoas como o João (que poderia ser a Maria, ou você mesmo) sofrem desta condição, acreditam que devem seguir um padrão de perfeição difícil de ser alcançado. A pessoa tem dificuldade de aceitar que tudo que alcançou foi merecido por seu talento e esforço, e que teve papel atuante em seus sucessos. Muitas vezes acreditam que tiveram a sorte ou chance que outras pessoas não tiveram, mas não percebem o alcance de suas ações.
Quem sofre com a síndrome do impostor esquece tudo o que fez de bom e só enfatiza os erros. Assim, pessoas como o nosso personagem João sofrem com pensamentos negativos recorrentes como:
“O que eles vão pensar de mim ?”;
“Se eu falhar, vão me evitar pois eu sou estrangeiro”;
“Meu colega fala inglês muito melhor do que eu”.
SER ESTRANGEIRO NÃO É UM DEFEITO DE FABRICAÇÃO
Ser estrangeiro traz para muitas pessoas um sentimento de insegurança e inadequação, uma sensação constante de que tenho que provar ou me esforçar mais do que os outros por ser diferente, inferior. Mas quem disse que esta característica precisa ser algo negativo? Será que é uma crença? Será que aprendemos em nossa sociedade que ser imigrante de um país economicamente menos favorecido, nos torna “seres inferiores”?
Já parou para pensar que você é sim um estrangeiro, mas esta é apenas uma de suas características e condições, não um fator limitante e exclusivo. Você tem muitas outras características que podem ser seu diferencial se usados ao seu favor e não contra você.
Você merece todos os créditos por todos os seus talentos, mas antes de buscar o reconhecimento dos outros, acredite nisso e mude a crença de que você não é bom o suficiente.
O melhor caminho é se aceitar. Não quero dizer que você deve se entregar e desistir de melhorar. Por exemplo, aperfeiçoar seu inglês, desenvolver o seu trabalho. Porém, quando falhamos, devemos reconhecer que aquilo era o melhor que poderíamos fazer naquele momento.
Pare de se comparar com os seus colegas ou com nativos, não tente ser algo que você não é. Você sempre será um estrangeiro e tudo bem. Você sempre terá um sotaque e acredite em mim, esta é a sua marca e o que te torna especial e diferente. Não tem nada de errado, esta é apenas uma característica, não é uma qualidade e nem defeito de fabricação. Quando nos comparamos com os outros, é fácil cair na armadilha de pensar que o outro é “melhor”.
Então, acredite: você merece exatamente tudo o que conquistou. Você viajou de tão longe e se você é capaz de transmitir essa sensação para as outras pessoas, mesmo falando em outro idioma, o mérito é todo seu. Mas, você precisa admitir isso para si mesmo.
Abandone esses padrões impossíveis de perfeição. Tenha mais autoconfiança e evite a busca pelos elogios alheios e dê menos importância para as suas falhas. Para isso, você deve ser gentil consigo mesmo. Aceite-se! Todo o sucesso que vem até nós é merecido, assim você conseguirá desfrutar da sensação de que você é a pessoa certa no lugar certo.
E aí, se identificou de alguma forma com a história do João ? Qualquer semelhança não é mera coincidência. Deixe aqui embaixo seus comentários :).
Silvana Byrne, é Psicóloga e fundadora da InterCultural Psychology, estabelecida em Dublin desde 2010. Com particular interesse em Psicoterapia Intercultural, oferece atendimento psicológico online e presencial em Dublin, para clientes de diversas nacionalidades em Português, Inglês e Espanhol.